Tudo, menos princesa!
Olhando nos meus olhos, minha filha avisou no mesmo tom de “Dadinho é o c..., meu nome agora é Zé Pequeno, p…!” Não era uma afronta, como talvez você esteja imaginando. Era algo dela.
O nascimento da minha filha foi a realização de um sonho. Sempre quis ser pai. E ser pai de menina. Poderia ajudá-la a ser uma mulher forte, confiante e empoderada. Nada desses estereótipos de donzela insegura e indefesa.
Para a decoração do quarto da bebê, sugeri a temática Kill Bill. Argumentei que a protagonista, Beatrix Kiddo (a Noiva), era uma excelente referência de mulher poderosa. Fui categoricamente vetado. Então, também não concordei com as princesinhas rosas que minha esposa propôs. Ficamos no meio termo e escolhemos ursinhas aviadoras-aventureiras.
"Princesinha" me remetia à "síndrome do imperador", termo que diz respeito ao comportamento abusivo de algumas crianças com os mais velhos. Sabe aqueles moleques autoritários, impulsivos e birrentos? Não, não. Minha filha seria o que quisesse, menos "princesinha".
De forma espontânea, ela sempre amou princesas. Nunca foi um problema. Até o fatídico dia em que eu a chamei pelo seu nome "Mavie!" e ela, em meio à brincadeira, me respondeu: "Não sou Mavie. Sou Princesa!" Tudo bem. Estava apenas incorporando a personagem do seu faz de conta. Eu, ator de profissão, tinha a obrigação de admirar essa atitude. Uma pequena atriz. Tal pai, tal filha.
A questão é que a Princesa usurpou minha filhinha para sempre. Se eu a chamasse de "Mavie" cem vezes, noventa e sete dessas ela me corrigiria "Mavie não! É Princesa!" No mesmo tom de “Dadinho é o c..., meu nome agora é Zé Pequeno, p…!” Não era uma afronta, como talvez você esteja imaginando. Era algo dela. Ficava verdadeiramente ofendida se chamada pelo nome. Como percebi que ela levava a sério essa questão, fui cedendo aos poucos. Em algumas semanas, eu estava adestrado. Passei a chamá-la de "Princesinha", no automático.
Mesmo tendo nascido em uma família brasileira de classe média, ela se identificava como princesa. Tive que superar meus preconceitos, aceitar e me referir a ela como tal. Pensando bem, eu deveria me orgulhar. Ela não se tornou princesa por ter contraído matrimônio com um príncipe. Não. Ela é princesa porque, mesmo contra todos os preconceitos e resistências, ela quis ser princesa. E, de maneira forte, confiante e empoderada, tomou o trono para si, se tornando uma dessas princesas que dá gosto de ver ostentando a coroa. Hoje, declaro com muito orgulho que papai ama essa Princesinha.
Gostou do texto? Tem outra crônica sobre meus filhos aqui: Crônica - Filhos ignorantes
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Muito obrigado!
Mais uma vez , parabéns! Estou adorando....as cromicas!
Muito bom!!! As vezes a gente paga a língua! E nesse caso então...